domingo, 15 de agosto de 2010

A não-eleição*

Sabe a última da eleição? Nem eu.
A maior notícia da corrida eleitoral é a falta de notícia da corrida eleitoral. Ao menos até agora.
O que se previa uma eleição sangrenta depois da Copa do Mundo tem sido um jogo tão insosso quanto os de nossa seleção na África.
Primeiro porque os candidatos principais em muito se parecem. Segundo porque, dada a popularidade do governo, todos dizem amém a Lula. E se Lula é símbolo de muitas coisas do país, é principalmente do consenso em torno do modelo muito mais econômico que político que deu a milhões de brasileiros pobres e a milhões de brasileiros ricos mais dinheiro no bolso e confiança no futuro.
Ninguém vai tirar o país desse caminho, tão óbvio quanto tardio. Nossa democracia demorou a descartar todas as mirabolantes teorias e planos que prometiam paraísos e entregavam infernos. Encontramos estabilidade seminal simplesmente seguindo as regras básicas do capitalismo de mercado. Foi a simplicidade, estúpido.
Tão simples que a população entende bem. E defende. No voto.
Outro dia tive o prazer de conhecer a cientista política Argelina Cheibub Figueiredo num debate da Fundação Educar no Insper-SP. Diante dos jovens alunos, a professora fez uma coisa muito importante: foi contra o senso comum. Defendeu sua posição de que o sistema político brasileiro é muito eficiente, realizando eleições periodicamente com grau muito satisfatório de liberdade e alternância.
A sucessão de eleições livres e eficientes é uma grande realização, inegável. Embora muito lentamente, esse processo parece trazer algum começo de depuração da política partidária, como aponta o movimento Ficha Limpa, essa sim a maior novidade (super positiva) desta eleição.
Com a educação de massas precária que temos no país, é natural que políticos abaixo de qualquer suspeita se elejam e reelejam com facilidade. Mas a consolidação da democracia e seu consenso em torno do modelo econômico fazem emergir essa massa que agora, cidadã porque consome, passará a exigir também melhor educação, saúde, saneamento, segurança... Que virão com políticos melhores.
No final, o verdadeiro salto para o desenvolvimento (e ainda estamos longe dele) virá pela educação. O mercado de trabalho em expansão exige mão-de-obra cada vez mais qualificada, e essa demanda, por força da natureza econômica, viabilizará a oferta.
Ainda investimos nada em educação do que precisamos para dar o salto final. Países como Cingapura e Coreia do Sul deram esse salto investindo muitas vezes mais que o Brasil nas suas escolas, professores e alunos.
A educação já é o novo consenso brasileiro. O que Lula fez ao materializar o consenso em torno da economia de mercado, o próximo presidente precisa fazer em relação à educação.
Voltando às eleiçõeszzzzzzzzz......
Se ela tiver que esquentar, e a propganda na TV certamente trará algum calor, que seja por uma disputa feroz pela melhor proposta para a educação.

*Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos Dinheiro (2004-2010) e Mundo (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha.com às quintas.

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